O Quebra Nozes e a Jornada da Heroína
Esta semana fomos ver o filme Quebra Nozes e os Quatro Reinos. Sou fã de filmes de fantasia, acalentam a minha alma, mexem comigo, acordam sempre dentro de mim estados de esperança, coragem, fé. Longe de ser o melhor filme de fantasia que se fez nos últimos tempos, e esclarecendo que este post não se trata de uma crítica cinematográfica, O Quebra Nozes e os Quatro Reinos retratam uma vez mais a mítica história da jornada do herói, neste caso da heroína.
A história de Clara
O Quebra Nozes e os Quatro Reinos conta a a história de Clara, uma menina esperta e independente que embarca numa jornada pelos Reino dos Doces, o Reino das Neves, o Reino das Flores e o sinistro Quarto Reino, em busca de uma chave perdida capaz de abrir um presente de valor incalculável. Clara é uma menina, que ao contrário da irmã que gosta de vestidos e penteados, perde horas a fio no sotão envolta nas suas invenções.
“As histórias estão repletas de instruções que nos guiam pelas complexidades da vida”.
Clarissa Pinkola Estés
O mito da jornada do herói
A jornada do herói é mítica, arquetípica, e tantas vezes retratada nas histórias, no cinema, etc. porque é a história de todos/as nós. Ele fala-nos de evolução e individuação. Fala-nos sobre as necessárias aventuras e demandas que o Eu tem de passar e viver para que possa desenvolver-se e amadurecer.
Estas histórias falam-nos sobre a psique e todas as forças que nela habitam. Mais do que entretenimento, estas histórias, tal como os contos de fada, têm a função de nos dar informações acerca do mundo misterioso que é o nosso Ser.
Um Eu maduro
Infelizmente vivemos numa sociedade de egos imaturos. Egos feridos que não têm consciência das suas verdadeiras motivações e necessidades, e que por isso andam numa busca exterior desenfreada pela felicidade e bem-estar, projectada em relações co-dependentes, no poder e no consumismo.
Se queremos viver numa sociedade consciente, é imperativo desenvolvermos egos maduros, pois só os egos maduros e íntegros podem tornar-se egos conscientes. E só egos conscientes podem ter acções conscientes, e consequentemente gerar uma sociedade madura, integra e consciente.
“A consciência muda pelas provações e revelações. É daí que surge uma nova consciência”.
Joseph Campbell
Os portais da consciência
O ensinamento destes contos e histórias é que para que a consciência se possa desenvolver e expandir, certas tarefas têm de ser empreendidas e completadas, e certos rituais de passagem têm de ser vividos.
Em todas as histórias de heróis e heroínas a personagem principal, o Eu, tem sempre de se entregar a uma jornada solitária, onde se depara com provações, tarefas que tem de completar, caminhos que tem de trilhar. Estas demandas, nada mais são do que competências novas que tem de adquirir, desenvolver.
A chave que abre os portais da consciência
No seu livro “Mulheres que correm com Lobos”, Clarissa Pinkola Estes afirma que as perguntas são as chaves que abrem os portais da consciência. A história do Quebra Nozes gira à volta de uma caixa que Clara quer abrir, mas não consegue, pois não tem a chave. A sua jornada começa pela busca dessa chave. É a pergunta “o que está dentro desta caixa?” que leva Clara a iniciar a sua jornada.
“Quem sou eu?”, “qual o sentido da vida”, “qual o meu propósito?”, “como possa deixar o mundo um pouco melhor?”, são perguntas que temos todos de colocar a nós próprios caso queiramos evoluir e crescer.
“Quando uma mulher decide não jogar mais com as regras do patriarcado, ela deixa de ter guias que lhe digam como actuar e como sentir.”
Maureen Murdock
A Jornada da Heroína
Segundo Maureen Murdock, a jornada da heroína difere em vários aspectos da jornada do herói. Há certas tarefas que a mulher tem de desempenhar para que possa desenvolver todo o seu potencial, transcender-se e cumprir-se. Nesta onda de resgate do sagrado feminino que vivemos hoje em dia, não é de estranhar, e até se recomenda, que surjam cada vez mais filmes sobre esta mítica jornada. As mulheres necessitam, e agradecem!
Nas últimas décadas o papel da mulher tem sofrido grandes mudanças. Há menos de 500 anos atrás a “caça às bruxas” enviava para a fogueira todas as mulheres que eram tidas como independentes e poderosas, e que não encaixavam no papel de virtuosa filha virgem ou fiel esposa e mãe. Penso que deve ser mais comum do que aquilo que se fala, o conflito interno entre o papel da mulher tradicional e o papel da mulher moderna.
Penso que este conflito está na base do sofrimento e do sentimento de estar perdida que muitas mulheres, tal como eu, sentem. É fundamental para todos nós (homens incluídos) resgatarmos o feminino.
“A nossa tarefa é curar a fragmentação interna que nos diz para não ouvirmos os nossos sentimentos, intuição e imagens internas”.
Maureen Murdock
O tesouro mais bem guardado
As histórias de heróis e heroínas tratam sempre em algum momento do resgate de algo. Seja uma princesa, um objecto ou no caso do Quebra Nozes, uma chave. Na verdade o que estas histórias e contos nos contam é que por debaixo de todos os medos, todas a feridas e mágoas, todas as máscaras, todas as sombras, há um tesouro escondido. E esse valioso tesouro, nada mais é do que tu próprio/a, a tua individualidade.
“Tudo o que buscas está dentro de ti”.
Joseph Campbell
Essa jornada para descobrires quem és, e cumprires-te no mundo, só tu a podes empreender. Ao contrário do que a sociedade e cultura te dizem tu és um Ser único, com talentos únicos, capaz de feitos dignos de um herói/heroína de contos de fadas.
Numa sociedade tão complexa como a nossa, estes contos e histórias são um verdadeiro alimento para a alma. <3
Add Your Comment